O Olhar das Pétalas

Papoula, Kenji Mizoguchi, 1935.
Entre o corpo e o desejo, entre o amor e a lógica, este violento e perpétuo colidir com a natureza. Não há sentimento em Mizoguchi que não seja partilhado por um ente vivo anterior à razão, e o detalhe de um pequeno jarro com flores pode ser a maior ponte (ao menos em termos de imagem e continuidade) entre corações que custam a se encontrar. Vem dele o corte, ou a emancipação do que fora preciso romper no quadro, a reconexão final dos contracampos que não podem se tocar na tela, mas se completam em nós. De um lado, o porta-retrato, a imagem da impossibilidade, do outro, um olhar que já não sabe confiar no futuro, que vacila na errância do corpo e fraqueja pela impotência do lar. Um cinema em que nunca se está só, já que o mundo e seus entes naturais tudo acompanham, uma obra que também não nos deixa, conectando em nós os espaços fendidos pelo que não podemos viver. Cada filme de Mizoguchi é como uma pétala que, mesmo seca, reaviva-nos.

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